sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

Parênteses e exclamação*

O novo ano já começou. O que mudou? Nada, absolutamente nada (exceto pelo número 9!). Se a vida vai continuar pregando peças, o pneu vai furar e vai chover demais, como diz Drummond, o que muda? Ah! Muda o olhar. É esse olhar especial que desejo a todos. Aliás, que esse olhar esteja sempre atento para ver além do que é simplesmente visto .

Eu, particularmente, não organizo minha vida por ano. Sou do tipo que diz: “Naquela época...”, referindo-me a algo que aconteceu há apenas dois dias atrás. Para dizer a verdade, sou péssima para me recordar de datas. Se algumas pessoas próximas não soubessem o dia do meu aniversário, é bem provável que me esqueceria dele também. Sobretudo, a minha memória é nítida para os fatos.

Os últimos cinco anos foram muitíssimo bem vividos. Eu realizei tudo o que desejei. Recebi promoções e convites, adotei uma filosofia (uma belíssima cultura para ser mais correta!), tive paixões secretas e públicas, conheci lugares urbanos, montanhosos e praianos fantásticos, contei segredos de liquidificador, ingressei na faculdade e fiz verdadeiras amizades.

Algumas pessoas podem concluir: “Ela mudou”. Volto a negar. Meu cabelo mudou, mas a minha essência continua a mesma. O que sou, cada vez mais, transborda (pinta e borda!), funde-se com o corpo e a mente, e me traz coisas belas. Isso ocorre toda vez que me canso de ser inteligente em querer conhecer os outros e passo a buscar a sabedoria em conhecer a mim mesma.


*Há tantos parentes e exclamação (!) que o texto mereceu o título


sábado, 14 de fevereiro de 2009

Poeira Humana

Ele não matava as mulheres. Apenas amava os seus interiores. Convivia com seus corpos durante meses. Abria, puxava, limpava, até tirar todas as gordurinhas indesejadas. Primeiro riscava-lhes delicadamente a pele e puxava devagarinho com vigor. Depois riscava mais profundo. E mais profundo. Vez ou outra sentia prazer em vê-las pulsar. Usava faca de cozinha para cortar-lhes toda a carne. E depositava seus olhos em recipientes, tal e qual bolas de gude. Só descansava ao ver cada osso intacto para os vender. Com o dinheiro que recebia, saía com suas garotas em busca do amor perfeito. Era, justamente, essa devoção que causava-lhes a morte.


Se não fosse pelo "t",
matava e amava
estariam embaralhadas
entre si.

sábado, 7 de fevereiro de 2009

Os depressivos

Qual é esta vida que tem uma cara para mim e outra para você? Ela tem várias caras. Afinal, é uma para mim, outra para você e mais outra para um monte de umbigos por aí.

Quem você espera que o salve? Um alguém? Esse alguém é um outro ser? Mas como, se para você o outro é sempre o problema? É o outro o culpado de tudo. Como o culpado pode lhe salvar? Como você confia no outro que, supostamente, causa-lhe o sofrimento?

Para que essa cara amarrada todo dia, moldando-lhe o rosto? Como você não entende o motivo de não receber elogios? Reclama que o ambiente é pesado, mas quando apagará a neblina da retina? Até quando o seu humor vai oscilar conforme as condições climáticas? Até quando seus olhos serão fundos, verdadeiras cuias de aparar lágrimas diárias? Até quando o seu corpo vai sofrer das doenças causadas pelo seu desequilíbrio emocional? Até quando as pessoas deverão sentir pena de você, enquanto poderia ser mais amor?



Se Eu Quiser Falar Com Deus*


Interpretação: Elis Regina

Composição: Gilberto Gil
Se eu quiser falar com Deus
Tenho que ficar a sós
Tenho que apagar a luz
Tenho que calar a voz
Tenho que encontrar a paz
Tenho que folgar os nós
Dos sapatos, da gravata
Dos desejos, dos receios
Tenho que esquecer a data
Tenho que perder a conta
Tenho que ter mãos vazias
Ter a alma e o corpo nus
Se eu quiser falar com Deus
Tenho que aceitar a dor
Tenho que comer o pão
Que o diabo amassou
Tenho que virar um cão
Tenho que lamber o chão
Dos palácios, dos castelos
Suntuosos do meu sonho
Tenho que me ver tristonho
Tenho que me achar medonho
E apesar de um mal tamanho
Alegrar meu coração
Se eu quiser falar com Deus
Tenho que me aventurar
Tenho que subir aos céus
Sem cordas pra segurar
Tenho que dizer adeus
Dar as costas, caminhar
Decidido, pela estrada
Que ao findar vai dar em nada
Nada, nada, nada, nada
Nada, nada, nada, nada
Nada, nada, nada, nada
Do que eu pensava encontrar

*como eu sempre digo:
troque a palavrinha